Desastre Planejado? Lula Lança Empréstimo para CLT com Juros de 40%
- Marcos Gouveia

- 24 de mar.
- 5 min de leitura
Críticas apontam benefício a bancos e alta do custo de vida forçando o trabalhador tomar dinheiro emprestado.

São Paulo, 24 de março de 2025 – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou nesta segunda-feira, 24 de março, uma nova linha de crédito consignado para trabalhadores com carteira assinada (CLT), acessível por meio do aplicativo da Carteira de Trabalho Digital.
O programa, chamado “Crédito do Trabalhador”, oferece empréstimos com taxas de juros que ultrapassam 40% ao ano, segundo informações divulgadas pelo governo, reacendendo discussões sobre os impactos da medida na economia e na vida da classe média e baixa.
A iniciativa ocorre em meio a gastos públicos bilionários e políticas que, para críticos, estão elevando o custo de vida e endividando o país, enquanto bancos devem ser os principais beneficiados com os altos juros.
O anúncio foi feito após meses de articulações para ampliar o acesso ao crédito no setor privado. O programa permite que trabalhadores formais solicitem empréstimos diretamente pelo aplicativo, com valores e condições definidos por instituições financeiras.
O governo estima que cerca de 47 milhões de pessoas, incluindo empregados domésticos, rurais e microempreendedores individuais (MEIs), possam ser elegíveis. A garantia dos empréstimos inclui até 10% do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e, em caso de demissão sem justa causa, 100% da multa rescisória.
A taxa de juros, fixada acima de 40% ao ano, foi apresentada como uma alternativa às condições do mercado, mas já enfrenta críticas por seu custo elevado.
A medida é parte de uma estratégia mais ampla do governo Lula, que assumiu em janeiro de 2023 prometendo melhorar as condições econômicas dos trabalhadores. Desde então, a administração ampliou despesas públicas em áreas como infraestrutura, programas sociais e subsídios, totalizando bilhões de reais em investimentos.
Em 2024, o déficit primário do país, excluindo juros da dívida, foi projetado em cerca de 1% do PIB, mas o pagamento de juros elevou o déficit total, pressionando as finanças públicas. Esse cenário coincide com um aumento no custo de vida, com a inflação acumulada em 12 meses superando 4% no início de 2025, afetando itens essenciais como alimentos e energia elétrica.
O “Crédito do Trabalhador” foi recebido com reações mistas. Para o governo, a iniciativa democratiza o acesso ao crédito, permitindo que trabalhadores formais escapem de dívidas mais caras, como as de cartão de crédito, que frequentemente ultrapassam 300% ao ano.
A plataforma digital, integrada ao sistema eSocial e à Carteira de Trabalho, promete agilizar o processo, com propostas de bancos enviadas em até 24 horas após a solicitação. No entanto, a taxa de 40% ao ano, equivalente a cerca de 3,40% ao mês, foi apontada como excessiva por analistas e representantes de trabalhadores, que esperavam juros mais baixos diante da promessa de usar o FGTS como garantia para reduzir riscos aos credores.
Críticos da medida argumentam que os bancos serão os maiores beneficiados. Instituições financeiras, como as mais de 80 autorizadas a operar o programa, terão acesso a um mercado potencial de 47 milhões de clientes, com garantias sólidas fornecidas pelo FGTS e pela multa rescisória.
Isso reduz o risco de inadimplência, enquanto as taxas elevadas asseguram lucros expressivos. Em 2024, o setor bancário brasileiro registrou ganhos recordes, com grandes players como Itaú, Bradesco e Banco do Brasil reportando bilhões em lucros líquidos, impulsionados por operações de crédito.
A nova linha consignada pode ampliar ainda mais esse desempenho, em um momento em que o governo busca estimular a economia sem arcar diretamente com os custos.
A política econômica de Lula tem sido alvo de debates intensos desde o início de seu terceiro mandato. Em 2023, o governo ampliou o Bolsa Família, elevando o valor médio do benefício e o número de beneficiários, enquanto lançou obras de infraestrutura, como a retomada do programa Minha Casa, Minha Vida.
Essas ações, somadas a subsídios para combustíveis e energia, aumentaram os gastos públicos em um cenário de arrecadação limitada. Para financiar essas despesas, o Tesouro Nacional recorreu a emissões de títulos da dívida, elevando o endividamento bruto do país, que se aproxima de 80% do PIB, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para 2025.
O aumento do custo de vida é outro ponto sensível. Nos últimos dois anos, a cesta básica subiu acima da inflação em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife, pressionando o orçamento de famílias de baixa e média renda. Fatores como a alta dos combustíveis, apesar dos subsídios, e a valorização do dólar, que encarece importações, contribuíram para esse cenário.
O Banco Central, que mantém a taxa Selic em 10,5% desde meados de 2024, resiste a pressões de Lula para reduzir os juros, argumentando que a inflação ainda exige cautela. A política monetária restritiva eleva o custo do crédito no mercado, o que torna os 40% ao ano do “Crédito do Trabalhador” uma opção cara, mas não fora do padrão atual.
Entre os trabalhadores, a percepção sobre o programa varia. Para alguns, a possibilidade de acessar crédito com garantia do FGTS é uma saída para emergências ou para quitar dívidas mais onerosas.
Um trabalhador formal pode, por exemplo, comprometer até 30% de seu salário com o pagamento do empréstimo, com a segurança de que o banco receberá via desconto em folha. No entanto, lideranças sindicais alertam para o risco de endividamento crônico.
Um salário mínimo de R$ 1.680 em 2025, por exemplo, teria até R$ 504 mensais comprometidos, deixando pouco espaço para despesas básicas em um contexto de preços em alta.
A oposição ao governo também entrou no debate. Parlamentares de partidos como o PL e o Novo classificaram a medida como uma manobra para maquiar problemas estruturais, como o desemprego, que afeta cerca de 8% da força de trabalho, e a informalidade, que atinge 38% dos ocupados, segundo o IBGE.
Eles argumentam que o crédito consignado, em vez de resolver a perda de poder de compra, pode aprofundar a dependência financeira da população, beneficiando bancos enquanto o governo evita reformas mais profundas, como a tributária ou a trabalhista.
O histórico de políticas de crédito no Brasil oferece um pano de fundo para a discussão. Durante os governos Lula entre 2003 e 2010, o crédito consignado para servidores públicos e aposentados foi ampliado, triplicando o volume disponível e estimulando o consumo.
A medida, na época, ajudou a aquecer a economia, mas também elevou os níveis de endividamento familiar, um problema que persiste até hoje. O novo programa repete essa lógica, agora voltada ao setor privado, mas em um contexto de maior fragilidade fiscal e inflação persistente.
Nas redes sociais, o lançamento gerou ampla repercussão, com opiniões divididas entre apoio à iniciativa e críticas aos juros altos e aos gastos públicos. A hashtag “Crédito do Trabalhador” circulou intensamente ao longo do dia, refletindo tanto o entusiasmo de apoiadores quanto a desconfiança de quem vê a medida como uma solução paliativa.
O governo, por sua vez, defende que o programa é um passo para incluir trabalhadores formais em um sistema financeiro mais justo, com planos de ajustar as condições conforme a adesão e os resultados forem avaliados.
A implementação do “Crédito do Trabalhador” começou hoje, com o aplicativo da Carteira de Trabalho Digital já habilitado para receber solicitações. As primeiras análises de crédito devem ser concluídas em até 48 horas, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego.
O sucesso da iniciativa dependerá de sua capacidade de equilibrar o acesso ao crédito com a proteção dos trabalhadores contra o superendividamento, em um momento em que o país enfrenta desafios fiscais e sociais crescentes.
Para analistas, o programa é um teste da habilidade de Lula em cumprir promessas de apoio à classe trabalhadora sem agravar as tensões econômicas que marcam seu terceiro mandato.
























