"UnReal Milk" Financiado por Bill Gates Chega aos Supermercados dos EUA
- Editorial O Bahia Post

- 29 de mar.
- 5 min de leitura
Leite cultivado em laboratório gera debate sobre sustentabilidade.

São Paulo, 29 de março de 2025 – A startup americana Brown Foods anunciou nesta semana que seu “UnReal Milk”, um leite cultivado em laboratório e indiretamente financiado por Bill Gates, está pronto para estrear nos supermercados dos Estados Unidos.
O produto, apresentado como o “primeiro leite de vaca cultivado em laboratório do mundo”, foi desenvolvido sem o uso de animais, utilizando células mamárias cultivadas em biorreatores para replicar os componentes do leite tradicional.
A iniciativa, que promete reduzir o impacto ambiental da indústria de laticínios, chega em um momento de crescente interesse por alternativas sustentáveis, mas também reacende discussões sobre segurança alimentar e aceitação pública.
A Brown Foods, fundada por ex-alunos das universidades de Stanford, Rice e IIT Delhi, descreve o “UnReal Milk” como uma solução para os desafios climáticos associados à pecuária leiteira.
Segundo a empresa, o processo sintetiza proteínas, gorduras e carboidratos idênticos aos do leite de vaca, sem a necessidade de ordenha ou criação de gado. A startup recebeu 2,36 milhões de dólares em uma rodada de financiamento inicial em 2024, liderada por investidores como Y Combinator, AgFunder – este último apoiado pela Fundação Bill e Melinda Gates –, SRI Capital, Amino Capital e Collaborative Fund.
O produto passou por validação independente no Whitehead Institute for Biomedical Research, ligado ao MIT, que confirmou a presença de todos os componentes essenciais do leite tradicional.
O lançamento ocorre em um contexto de transformação no setor alimentício americano. Desde a posse de Donald Trump como presidente em 20 de janeiro de 2025, políticas voltadas para inovação tecnológica têm ganhado destaque, embora o governo também enfrente pressões de setores agrícolas tradicionais.
O “UnReal Milk” é parte de uma onda de alimentos cultivados em laboratório que inclui carne, frango e peixe, impulsionada por empresas como UPSIDE Foods e GOOD Meat, ambas já aprovadas para venda nos EUA em 2023.
A Brown Foods afirma que seu leite pode ser processado em manteiga, queijo e sorvete, oferecendo uma alternativa de baixo carbono à produção convencional, que responde por cerca de 3% das emissões globais de gases de efeito estufa, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
A conexão com Bill Gates, um dos maiores defensores de alimentos sintéticos, amplificou o interesse e as críticas ao produto. Gates, por meio de sua fundação e do fundo Breakthrough Energy Ventures, investiu em várias startups de alimentos alternativos, como a Biomilq, que desenvolve leite materno cultivado, e a Memphis Meats, focada em carne sintética.
Embora o envolvimento direto de Gates no “UnReal Milk” seja indireto, via AgFunder, seu nome foi destacado em posts no X, como um que afirmou: “Leite de vaca cultivado em laboratório por Bill Gates deve invadir supermercados dos EUA.” Outro usuário escreveu: “Bill Gates-funded lab-grown ‘UnReal Milk’ set to hit U.S. supermarkets,” refletindo o sentimento misto de curiosidade e desconfiança entre o público.
A Brown Foods destaca que o “UnReal Milk” é molecularmente idêntico ao leite de vaca, contendo triglicerídeos, carboidratos e proteínas como caseína e lactoglobulinas.
Testes preliminares sugerem que o sabor e a textura são comparáveis ao leite tradicional, embora a empresa não tenha divulgado detalhes sobre o processo de produção em escala ou os custos finais para o consumidor. O produto está em fase de validação para aprovação pela Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA), que já regulamentou alimentos cultivados como “geralmente reconhecidos como seguros” (GRAS) em casos anteriores, como o da Perfect Day, que usa fermentação de precisão para criar laticínios sintéticos desde 2021.
A estreia do “UnReal Milk” nos supermercados americanos é aguardada para os próximos meses, com a empresa planejando parcerias com grandes redes varejistas.
Nos EUA, onde o consumo anual de leite per capita caiu de 247 litros em 1975 para cerca de 140 litros em 2023, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), alternativas como leites vegetais (soja, amêndoa, aveia) já dominam 16% do mercado.
O “UnReal Milk” entra como uma opção que busca atrair tanto consumidores preocupados com o meio ambiente quanto aqueles que preferem o perfil nutricional do leite animal ao das versões plant-based.
No entanto, a recepção não é unânime. A indústria de laticínios tradicional, que emprega milhões e movimenta bilhões de dólares, vê os produtos cultivados como uma ameaça. Em estados como Flórida e Alabama, legislações recentes proibiram a venda de carne cultivada em 2024, e há pressão para que laticínios sintéticos enfrentem restrições semelhantes, incluindo exigências de rotulagem como “cultivado em laboratório”.
Produtores rurais argumentam que o leite tradicional é mais natural e economicamente vital para comunidades agrícolas, enquanto defensores do “UnReal Milk” apontam que a pecuária intensiva contribui para desmatamento, emissões de metano e uso excessivo de água.
A segurança alimentar também está em debate. Embora a Brown Foods afirme que seu processo é “mais controlável” que a produção convencional, eliminando riscos como contaminações bacterianas comuns em fazendas, críticos questionam os impactos de longo prazo do consumo de alimentos cultivados em biorreatores.
Nos posts do X, alguns usuários expressaram ceticismo: “Financiada por Bill Gates e globalistas, a guerra contra as vacas desencadeou sua próxima arma: o ‘UnReal Milk’,” sugerindo uma resistência cultural a alimentos percebidos como artificiais ou parte de uma agenda maior.
O envolvimento de Gates, amplamente associado a iniciativas climáticas, reforça tanto o apelo quanto as controvérsias. Em 2021, ele defendeu em entrevista ao MIT Technology Review que países ricos deveriam adotar carne sintética para reduzir emissões, uma visão que ecoa no “UnReal Milk”.
Sua fundação tem investido bilhões em tecnologias de baixo carbono, e o AgFunder, que apoia a Brown Foods, faz parte dessa estratégia. No entanto, não há evidências de que Gates esteja diretamente por trás do produto ou que ele vise “inundar” o mercado, como alguns posts sugerem, mas sim que o investimento reflete uma aposta em soluções escaláveis para a crise climática.
No Brasil, onde a pecuária leiteira é um setor chave, com produção anual de cerca de 34 bilhões de litros segundo o IBGE, o “UnReal Milk” ainda não tem planos de chegada, mas pode influenciar o mercado global.
A crescente demanda por alternativas sustentáveis já impulsionou leites vegetais no país, e a entrada de um concorrente cultivado poderia pressionar os preços e as práticas locais. Especialistas preveem que, se bem-sucedido nos EUA, o modelo da Brown Foods pode se expandir para outros mercados desenvolvidos nos próximos anos.
A Brown Foods planeja iniciar a comercialização em pequena escala, com testes em supermercados selecionados da Costa Leste americana até o fim de 2025. O preço inicial não foi revelado, mas a empresa promete competir com o leite tradicional à medida que a produção escalar.
A startup também destaca benefícios éticos, como a eliminação da exploração animal, um ponto que ressoa com consumidores veganos e ambientalistas, mas que enfrenta resistência entre quem valoriza a tradição da pecuária.
O lançamento do “UnReal Milk” marca um passo significativo na corrida por alimentos cultivados, mas seu sucesso dependerá de fatores como aprovação regulatória, aceitação do consumidor e capacidade de competir com um mercado estabelecido.
Enquanto a Brown Foods celebra o que chama de “avanço científico”, o debate entre inovação e tradição promete se intensificar, com o nome de Bill Gates servindo como catalisador tanto para o apoio quanto para as críticas.
























